Meu Perfil / My Profile

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Professor Titular, Instituto de Saúde Coletiva/UFBA. Doctor Honoris Causa – McGill University, Canadá. Ph.D. Epidemiology - UNC Chapel Hill. Professor Visitante em: University of North Carolina Chapel Hill (1987, 1989), University of California Berkeley (1990-1991), Université de Montréal (1993-1994), Harvard University (2001-2002). Escrevi alguns livros sobre a ciência epidemiológica: Epidemiología sin números (OPS/Paltex, 1992); A clínica e a epidemiologia (Abrasco, 1997); A ciência da saúde (Hucitec, 2000); La ciencia tímida: ensayos hacia la deconstrucción de la epidemiología (Editorial Lugar, 2000); Epidemiologia & Saúde (com Zélia Rouquayrol – Guanabara-Koogan, 6. ed. 2003). Fui Reitor da UFBA de 2002 a 2010. Relato essa experiência nos seguintes livros: Universidade Nova: Textos Críticos e Esperançosos (Editora UnB, 2007), Memorial da Universidade Nova - UFBA 2002-2010 (EDUFBA, 2010) e, em co-autoria com Boaventura Sousa Santos, A Universidade no Século XXI: Para uma Universidade Nova (Almedina, 2008).

sexta-feira, 15 de julho de 2011

AÇÕES AFIRMATIVAS SEM FRONTEIRAS


Na última reunião do Conselho Superior da CAPES, anteontem, foi apresentado o programa Ciências sem Fronteiras. Em resposta a um desafio posto por Obama, o governo federal prepara-se para bancar mais de 75 mil bolsas de estudos no exterior. Ambiciosa proposta que levanta polêmicas desde sua concepção. Com isso, em quatro anos, praticamente alcançaremos o patamar do investimento chinês anual. Dois pontos têm sido criticados: por um lado, a lista de áreas exclui todo o campo das artes e das ciências humanas, focalizando áreas tecnológicas, principalmente engenharias, onde supostamente haveria maior demanda e menor capacidade nacional de formação. Por outro lado, estabelece como destino único para os bolsistas as 30 melhores universidades do mundo em cada área do conhecimento, tomando como base rankings internacionais. 

No nível de graduação, serão ofertadas 25.700 bolsas-sanduíche. Não há como negar o mérito e a oportunidade dessa iniciativa. Entretanto, dois problemas sérios precisam ser considerados:

Primeiro, há incompatibilidade estrutural entre os regimes curriculares do Brasil e dos países que receberão nossos alunos de graduação. Identifico um risco concreto de não aproveitamento do esforço porque nossos alunos não terão acesso aos cursos de graduação em situação de equivalência plena com o velho regime nacional de formação linear. Na América do Norte, em nenhum curso profissional, os alunos entram diretamente do ensino médio; na Europa, com o Processo de Bolonha, isso já ocorre na maioria das áreas acadêmicas e carreiras profissionais. Nesse caso, duas soluções: a) instituições nacionais com regime de ciclos terão prioridade. b) Compromisso das universidades recipientes no sentido da alocação dos nossos alunos em programas integráveis aos currículos brasileiros, que ainda são bonapartistas.

Segundo, e para mim muito preocupante: o critério principal de seleção dos alunos será (e não poderia ser diferente) o domínio do idioma inglês. Mas este é justamente o novo divisor de classes no Brasil (jovens de classe pobre nunca fizeram curso de Inglês, nem intercâmbio internacional, não conhecem Disney ou Paris, têm acesso limitado à web). Há nesse caso um forte risco de, mais uma vez, estarmos patrocinando os projetos individuais de um nicho específico da sociedade brasileira, a classe média e alta urbana, sua fração dominante, cujos filhos tendencialmente já são bilíngües. A perversão da educação superior seria nesse caso quádrupla. Só para reiterar os 3 efeitos perversos antecedentes: (i) ensino básico público não prepara para aprovação nas universidades públicas; (ii) estas têm maioria de alunos de classe média e alta; (iii) adestrados para aprovação no vestibular por meio de massiva renúncia fiscal. Caso não se retifique a lógica do programa, a política pública de apoio ao desenvolvimento de fato viabilizará maior acesso à educação superior internacional, com matrículas pagas e bolsa de estudos, nas melhores universidades do mundo, para a parcela da juventude que têm acesso a mais recursos econômicos, sociais e políticos. O quarto efeito perverso será portanto excluir do programa justamente aqueles que mais aproveitariam dessa valiosa experiência, que não teriam outro meio de se integrar à cultura do mundo globalizado e que mais necessitam de inclusão e mobilidade social.

Há uma solução de longo prazo e duas saídas pontuais e imediatas: 
  1. Cotas sociais para a seleção ao Programa, evidentemente após demonstração do domínio da língua estrangeira.
  2. Programas intensivos de nivelamento realizado na IES brasileira, com estágio prévio de proficiência na instituição estrangeira.
A solução de longo prazo, estratégica e sustentada, compreende a implantação no Brasil de um regime de ciclos na graduação, similar e compatível ao college norte-americano e ao bachelor de Bolonha. Esse movimento aliás já está em curso, com mais de 11.000 alunos em bacharelados gerais em 13 universidades públicas. Cursos de graduação nesse regime, especialmente na modalidade dos Bacharelados Interdisciplinares, tanto permite superar a incompatibilidade entre currículos quanto significa mais oportunidade de preparar alunos de origem social pobre nos repertórios linguísticos e culturais requeridos,  além de acolher com mais facilidade os créditos cursados no retorno.

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